Coração Gelado
Em uma simples conversa de ônibus, contava-lhes parábolas:
Havia certa mulher que produzia e colecionava esculturas dentro de cubos de gelo. Eram bonequinhos encantados, dotados de vida própria e que voluntariamente ficavam presos dentro dos pequenos cubos.
O processo para colocá-los lá era, no mínimo, interessante e artesanal. Uma pequena vela acesa derretia um caminho liso e preciso no cubo, sem atravessá-lo, sempre do tamanho exato necessário para deslizar o pequeno boneco. Esse caminho era então fechado, deixando apenas uma pequena e frágil costura.
Certo dia, aquela que tão carinhosamente os colocara ali passava em sua visita matinal quando percebeu uma pequena poça logo abaixo do cubo que mais amava. Ele havia fugido. A frágil costura havia sido quebrada e com ela, um pedaço de um coração.
Depois de chorar dias e dias, achou a suposta solução. Substituiria todos aqueles bonecos por réplicas fiéis feitas também de gelo. "Desse jeito" disse ela "não tenho mais desgosto". Feito isso, prendeu todos os pobres bonequinhos numa caixa trancada.
O tempo passou e as visitas matinais continuavam a descobrir poças, mas agora de lágrimas. Sentia falta daqueles momentos raros de alegria. Ver as mãozinhas acenando de dentro das pequenas caixas geladas. Precisava daquilo de volta.
Foi assim que descobriu que seus únicos amigos eram aqueles na caixa e que eles mereciam mais do que um cubo de gelo como morada. Com a mesma vela que cuidadosamente as construía... destruiu uma a uma. Abriu a caixa e simplesmente deixou-os ir.
Todos ficaram.
Ahhh... Existe ainda hoje uma pequena cadeira vazia em cada reunião.
Volta?
Esse texto é dedicado a minha amiga Ana Carolina Assumpção que "ajudou" na sua idealização.